A Cátia Rosa dá a cona e o cu a todos, lê-se num muro ao lado de uma paragem de autocarro. De uma perspectiva gramatical, identifico com gosto a correcção do texto, o uso de maiúsculas nos nomes, a exactidão dos acentos. Poderia, se quisesse, questionar o predicado, porém.
Dá, do verbo dar, é inadequado. Escolheria antes A Cátia Rosa aluga a cona e o cu a todos, ou mesmo empresta. Ainda que, se é perfeição que busco, prefira disponibiliza, que me parece uma espécie de empréstimo à vista, isto é: usa que eu deixo, mas não penses que me vou embora e ficas sozinho com o que é meu, nada disso, podes usar, contudo eu fico aqui a ver se não estragas.
É, claramente, de disponibilizar que se trata.
Além de ilegal, porque é proibido escrever em muros com sprays, ainda que a mensagem seja, como é, de amor, ignoro até onde abonará a favor da senhora Cátia Rosa, que eu desconheço e por isso assim trato e considero.
Dar a cona e o cu a todos parece-me uma generalização absurda. Primeiro, o complemento todos abarca uma quantidade de seres que facilmente extrapola as fronteiras da possibilidade, alargando-se imparavelmente para sexos, raças e até espécies. A todos, portanto, soa-me a bem mais que um exagero, acima de hipérbole, é, claramente, uma impossibilidade e por isso perde crédito e até nomeação gramatical. Seria o mesmo que dizer: vou ali almoçar e depois, finda a digestão, vou, como é meu hábito desde há muito, cagar à Lua. Ninguém me levaria a sério e eu compreenderia as razões.
Só concebo o uso da palavra todos porque confere, indesmentivelmente, energia. Se a tirada fosse A Cátia Rosa dá a cona e o cu a quase todos, pareceria menos austera, pois reservar-lhe-ia, a priori, à senhora Cátia, particularidades de selecção que talvez não possua.
Se fosse dá a cona e o cu a quatro ou cinco, permaneceria com má reputação, no entanto essa opção levaria a que alguém perguntasse por baixo, num spray de outra cor: a quem? quem são os cinco? Isso poderia, pois, conduzir a um diálogo de estranhos num muro, gestos, repito, ilegais.
Se fosse A Cátia Rosa dá a cona e o cu ao Luís, isso, para quem passa e não conhece nem um nem outro, de pouco vale como ofensa e muito menos como entretém. É da vida de cada um, conjugal, ninguém tem nada a ver com isso. Ainda que aumente a precisão, perde-se, curiosamente, o anterior mundo de possibilidades.
A frase está, estranhamente, riscada, as letras horizontalmente atravessadas, o que conduz a questão para outro domínio: quem redigiu e quem reprovou? O autor só a riscaria se porventura se tivesse enganado a escrevê-la. Imagine-se o horror de ortografar tal obra de arte e depois atestar que se tinha colocado, sabe-se lá porque paragem cerebral, um acento circunflexo no o da palavra cona: côna. Só mesmo riscá-la logo de seguida para ninguém dar por isso.
Parece-me, continuando, num assomo de perspicácia, que terá sido Cátia Rosa a riscar. Tinha afastado à partida a possibilidade de a frase ser um classificado, pois não havia número de telefone com ela, nem sequer referência ao grau universitário de dona Cátia. Era, antes, sem dúvidas, uma opção de enxovalho, até pela crueza, despida de eufemismos, manifestada na escolha criteriosa dos termos.
E quem escreveu?
Perguntaram-me num dia destes, naquilo que foi para mim um constrangedor momento, se eu sabia quantos tipos de mulheres há. Atrapalhado e ignorante, devolvi: como assim?
«Três: as santas, que andam só com um; as putas, que andam com todos; e ainda as filhas da puta, que andam com todos menos comigo! Hahahahaha», responderam-me.
Não descubro interesse na anedota, primária graçola de aldeão, todavia a ordem do raciocínio exposto ajuda-me a concluir que quem escreveu foi, justamente, alguém a quem Cátia Rosa nada deu. E assim se explica, ainda, o risco que ela fez na frase, que para o autor resultará subentendidamente numa espécie de: confirmo, dei a todos menos a ti. Ainda que isso lá não esteja escrito, pois é ilegal escrever em muros e Cátia Rosa disponibiliza o que é dela não anda a roubar para disponibilizar aos outros. Grande Cátia Rosa, dá-lhes.
Saturday, August 11, 2007
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3 comments:
Se para dar, emprestar ou disponibilizar a cona e o cu fosse necessário um contrato do género daqueles que se redigem no acto de compra de uma habitação, poder-se-ia incluir uma alínea em que a Cátia Rosa, com as maiúsculas no sítio certo, daria usufruto da dita cuja a todos. Não?
Eheheheheh, muito bom :-)
Dá-lhes!!!
Eu acho que quem escreveu andava triste. Porque não era o "todos". E também queria fazer parte desse restrito grupo de "todos" que recebem cona de Cátia Rosa.
Quanto à questão de quem rasurou o edifício. Sinceramente, eu acho que foi o "todos". E pensem lá um bocadinho: se eu fosse o "todos" não iria gostar de ver o nome da mulher dos meus sonhos a ser difamados. Podia ser "todos", mas corno é que não...
pim: Evidentemente, mas desconfio que Cátia Rosa não dará garantias de durabilidade do produto e muito menos passará facturas.
bruno: acho que o «todos», entretanto, entrou em profunda depressão nervosa.
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