Thursday, July 26, 2007

Legalize doping


Cambada de mamados, estes gajos do ciclismo. Mas eu, lá no fundo, acho bem. Já vi provas de ciclismo de perto e sinto, ainda que nunca tenha tentado, que há malta que faz coisas impossíveis. Eu, como espectador, quero é ver coisas impossíveis. Não quero ver ciclistas que digam: «E pá, vamos lá a ter calma, não sei se consigo subir a essa montanha toda, isso é coisa para a dada altura ter alguns dez graus de inclinação na estrada, isso dá cabo de um gajo, nem pensem.»
Eu quero é ver a pelotão a amarinhar e ficar a pensar: «Sacanas, estes gajos são mesmo os maiores, eu era incapaz de fazer aquilo. Não sei como eles conseguem, chiça.»
Lá está, no fundo até sei, provavelmente vão dopados, mas eu quero lá saber. Legalize!

Tuesday, July 24, 2007

Morte aos koalas


A Natureza desperta-me curiosidade natural. Perturba-me a ideia de que além do nosso mais amplificado entendimento, nada nos torne verdadeiramente notáveis no reino. Vejamos: somos mais fracos do que os de grande porte, mais vagarosos e menos elásticos que os felinos e tantos outros; a nossa capacidade olfactiva é trezentas e não sei quantas vezes menor do que a dos cães e a visual é ridícula comparada à de uma águia. E mais: juntos somos minúscula parte do número de insectos na Terra. Quer isto dizer que se os outros animais fossem um bocado espertos e organizados, estávamos lixados.


No entanto, apesar de tudo, somos mais animalescos do que pensamos. Há, por exemplo, um símio que tem maldade intrínseca, como nós: o babuíno, que bate nos outros elementos do seu grupo, incluindo fêmeas, de forma indiscriminada. É um macaco que aprecia bulha e sarrafada.


Num dia destes, descobri algo que me forneceu de ideias babuínas. Não sei até que ponto será exagero, todavia parece que os koalas têm um coração tão frágil que podem morrer em contacto com humanos. Acagaçam-se de tal forma que se um de nós – que, como referi, comparados com os outros temos muito miolo mas pouca côdea - lhe pegar ao colo podem ficar-se ali, num suspiro de horror.


Sorri quando o descobri e a única coisa que me passou pela cabeça foi viajar para a Austrália, aproximar-me silenciosamente de um eucalipto cheio de koalas e, quando não estivessem à espera, tranquilamente a comer folhas, correr à volta do tronco aos gritos como se o mundo fosse acabar. Seria ver os coalas, coitados, a caírem da árvore como fruta madura.


É para ter ideias parvas como esta que se pensa e os outros não? Ou somos mais babuínos do que pensamos?

Thursday, July 19, 2007

Litortura

Às vezes chateia-me a literatura que não percebo. Ora vejamos:

«Ela parava no espaço como se o tempo não contasse, ela vivia apenas em si como se o mundo fosse dos outros. Eu ficava por ali perdido nos caminhos por mim traçados, sentado num comboio sem viagens, provando coisas sem sabores.
De cada vez que as noites duram assim, como se a manhã fosse a coisa mais distante a inventar. De cada vez que a única coisa em comum que temos é a outra margem, ao fundo, para onde olhamos como se nenhum de nós estivesse aqui, como se o tempo fosse mais importante que o espaço e nos apetecesse sair daqui para ir passear no ontem»

Escrevi isto devia ter uns 16 anos ou 17, dei por estas coisas num bloco muito antigo. Hoje não faço ideia do que significam e fico danado por sentir que a coisa teve, certamente, um poder qualquer quando foi escrita. E hoje é um resto.

Já li muita coisa que não percebi, muitos autores que descubro em esforço, mas esta é, enfim, a descoberta da minha literatura afundada no oceano, a minha litortura, palavra que não existe mas que inventei para as coisas que escrevi e me fizeram doer. Litortura.

Wednesday, July 18, 2007

Do número de gajas comidas

Diz um amigo para outro, orgulhoso, num bar onde não se pode fumar cheio de fumo.

- Já comi mais de 400 gajas. Pergunta a quem quiseres se tens dúvidas.
- Pergunto a quem?
- Por aí.
- Para avaliar a veracidade precisaria de perguntar às 400 gajas que comeste. E estaria até sujeito a que algumas, mesmo sendo verdade, te desmentissem. Para compensar, só se algumas que tu não tivesses comido dissessem, sabe-se lá porquê, que realmente foram comidas por ti. Como posso saber isso?
- Pois, não podes, tens de confiar em mim.
- Tenho de acreditar que apesar de teres 24 anos já comeste mais de 400 gajas?
- Pois. Tu, quantas comeste?
- Oito.
- Pfff, xonhinhas. Eu, mais de quatrocentas, contadinhas.
- Contas com as que comeste por chat?
- Não.
- Mas contabilizas as punhetas, certo?
- Não contabilizo nada. Acreditas ou não?
- Acreditas que eu só comi oito?
- Acredito.
- E que uma das oito foi por chat?
- Acredito.
- Então pronto, também acredito em ti. Os amigos são para acreditar nestas merdas.

Friday, July 13, 2007

Dizer as letras todas

Tenho grande simpatia por pessoas que não dizem os éles. Assim como pelas incapazes de pronunciar erres. Nunca conheci uma que, em simultâneo, não diga qualquer uma destas letras e por isso tenho muita pena.

Já não tolero fanhosos. O fanhoso é um indivíduo que fala metendo a voz pelo nariz.

Gostava de conhecer gente que não diga outras letras. Como falará alguém que não diz ús? Deve ser fantástico alguém não dizer os ús, porque fica também impossibilitado de dizer muitos ós. Alguém que não diga ús, o que dirá quando quiser dizer o urso? Julgo que terá de ficar calada.

Se fosse rico e tivesse direito a extravagâncias, teria no meu castelo de Valáquia uma galeria de gente que não diz coisas, desde o a ao z, e iria torturá-los, consoante a minha disposição, com pedidos de frases impossíveis. «Tu, que não dizes os vês e ainda por cima tens um azar do caraças que te chamas Venâncio, lê-me lá esta frase, vá: o Vasquinho bebeu vinho venenoso e morreu de overdose de uvas», ordenaria eu, senhor supremo do universo de quem consegue dizer as letrinhas todas, tal e qual como ficam espalhadas pela sopa
«Tu, que não dizes os ás, lê-me lá o nome desta marca antiga de óleo, vá: Três ás girassol».
Mantenho a minha busca por alguém que não diga nem os erres nem os éles, ao mesmo tempo. Para mim, um Santo Graal da oratória.

Monday, July 9, 2007

Dependente de tóxicos

Compreendi quando Keith Richards confessou ter snifado cinzas do pai. Trata-se de uma actividade que me provocaria náuseas e eternos problemas de consciência, mas compreendi.
Há um campo de snifagem onde me incluo desde miúdo. Quando acordava pela manhã, ia à cozinha acender o esquentador para tomar banho e ficava, depois, a aspirar avidamente o fiozinho de fumo que ficava no ar, a sair do fósforo. Acredito que também isto me tenha causado problemas de consciência, ainda que mais relacionados com a sua perda do que com o seu peso.

Tenho um amigo que me confessa interesse no cheiro do pó para a máquina de lavar, outro que recentemente me falou de Sonasol, um tal que prefere incenso e ainda um que quase se deita nas bombas de gasolina para inalar vapores do gasóleo e que, por sua vontade, respiraria monóxido de carbono permanentemente.
Da escola primária, recordo um colega de carteira que bebia a água de lavar pincéis que ficava nos frasquinhos e mamava borrachas inteiras como quem trincava rebuçados de mentol. Cambada de drogados.

Sempre que eu chegava a casa e tentava explicar à minha mãe que me tinham comido as borrachas, ela não sabia que pensar. Imagino que lhe tenha passado pela cabeça proibir-me de andar com tais más companhias, contudo isso implicaria tirar-me da escola. Nunca o fez. No fundo desconfiava que tudo era por mim inventado, uma artimanha para deixar de frequentar as aulas.
Um dia também me desapareceu um tubo de cola UHU. Já nem estranhei. Lembro-me de a minha mãe me ter deixado de comprar material escolar, tive de pedir borrachas emprestadas até à quarta classe.

Pergunto-me como terá começado o Keith Richards.

Sunday, July 8, 2007

A anedota que morreu de tanto rir

- Pá, pá, digam-me lá: se um porco tem quatro pernas, então de onde vem o fiambre de perna extra?
Hahahaha, riem-se as pessoas na mesa do café.

Fico constrangido ao ponto de às vezes não me conseguir rir mesmo que ache piada. Por outro lado, se não achar piada sinto-me forçado a sorrir. Uma anedota não é uma anedota, é uma imposição ao meu estado de espírito, é algo que me vira ao contrário.

Apetece alimentar a laracha até lhe sugar a comédia.

- Não percebi.
- Não percebeste, então? Se só tem quatro pernas, qual será a perna extra?
- Não sei.
- Então, é, tipo, outro membro, hehehe, estás a ver?
- Pretendes com isso afirmar que o fiambre de perna extra é feito das pichas dos porcos?
- Sim, quer dizer, a piada é essa.
- Qual é a piada de comer fiambre feito de picha de porco?
- Mas não se come a sério, o de perna extra é de perna como as outras.
- ...
- Não era a sério. Agora que me fizeste as perguntas tornaste a piada numa situação que deixa de ter piada, uma anti-piada.

Percebem o que quero dizer? A anedota, em si, no fundo, é como eu: virada ao contrário perde-se no sentido. As coisas engraçadas são as que acontecem e só muito raramente as que se contam. É por isso que me sinto triste com este meu último post, este aqui em baixo sobre fazer o amor dentro de uma carruagem de metro. Sujeito-me a que alguém me pergunte:

- Mas sabes o que quer dizer metrossexual ou és estúpido?

E eu lá teria de responder:

- Não era a sério. Agora que me fizeste as perguntas tornaste a piada numa situação que deixa de ter piada, uma anti-piada.

Acabemos com as piadas, fiquemos sisudos.

Metrossexual

Alguém que tenha o fetiche de fazer o amor dentro de uma carruagem do metro será metrossexual?

Sunday, July 1, 2007

Júlio Isidro

Tenho desmedido respeito por Júlio Isidro. Assim é desde os meus tempos de associado do Clube Amigos Disney.
Lembro-me de, já não sei onde, Júlio Isidro ter apresentado um passatempo para miúdos, na rua. Passava eu com meus pais e o concurso era canja: empurrar uma enorme bola contra colossais pinos. As crianças que os derrubassem ganhavam uma t-shirt com um gorila estampado, aquele das pastilhas. Júlio Isidro, porém, verdadeiro benemérito, oferecia uma camisola a qualquer miúdo que deitasse pelo menos um pino.

Eu, meio envergonhado, lá fui tentar, impingido pelos meus pais. Não derrubei um sequer. A gigantesca bola rolou vergonhosamente para fora da pista, eu virei costas e já caminhava para abrigo materno, humilhado nos meus três anos, quando Júlio Isidro, envolto de uma divina luz brilhante, desceu das nuvens, sorriu-me e deu-me a t-shirt do gorila na mesma. Obrigado, Júlio Isidro.

Sempre o considerei uma referência do saber estar, da forma educada, controlada e culta de conduzir um programa de televisão. Num dia destes, ouvi-o dizer: «A banda as Sáizor Sisters.» Não sendo Sáizor, como ele pronunciou, mas Scissor, como se diz, é, acho eu, pior do que dizer as em vez de os. Até porque, tratando-se de quem se trata, chamar-lhes as afigura-se-me a milhas de qualquer ofensa. Perdoo-lhe o erro. Dar-lhe-ia uma t-shirt com um gorila na mesma.